jornalismo investigativo, o que tem a ver? (anotações da Abraji – parte 2)
conhecendo o terreno: como cruzei pesquisas sobre jornalismo investigativo e cobertura das plataformas
📌o que tem aqui: minha apresentação no X Seminário de Pesquisa em Jornalismo Investigativo sobre o próprio seminário.
🎯 voltei! a edição anterior foi ‘grandinha’, então, dado o devido respiro para consumo, uma edição mais curta hoje – eu tentei.
🧵 essa é a parte ⅔ das minhas anotações do Congresso da Abraji. se perdeu, aqui a primeira:
🙋
eu estou naquele momento da pesquisa em que você procura fortalecer seu entendimento sobre o “estado da arte”. grosso modo, trata-se da fase em que você olha para o campo da pesquisa em que está inserido e mapeia o trabalho que já foi feito e identifica no que você pode contribuir dali pra frente e em quais termos e em que nível está a discussão que você quer produzir a partir do objeto pesquisado.
eu tenho feito um esforço de ir além dos lugares mais óbvios que é a busca através de palavras-chaves nos periódicos, no Google Acadêmico etc. nesse sentido, pensei:
quais eventos, grupos de pesquisa e de trabalho produzem pesquisas relacionadas?
será que eu acho algo sobre meu tema no Seminário de Pesquisa em Jornalismo Investigativo da Abraji?
será que a cobertura de plataformas pode ser enquadrada como Jornalismo Investigativo?
essas perguntas iniciais me levaram a fazer um levantamento dos artigos que já foram publicados nos anais do seminário da Abraji. primeiro de forma mais livre e depois de modo mais sistemático, com o uso do Atlas.ti, e levantando preocupações que a pesquisa sobre o jornalismo investigativo tem que poderiam ser úteis para refletir sobre a cobertura das plataformas (tema da minha pesquisa no doutorado).
até aqui, o resultado é este artigo que submeti e foi aceito para a programação da décima edição do seminário, este ano:
📝
O inimigo agora é outro: mapeando uma agenda de pesquisa para intersecção do jornalismo investigativo com a cobertura das plataformas
🔗 cite/adicione no seu gerenciador de bibliografia (.ris)
🔗 link para a apresentaçãoque exibi no evento
🔗 a base de dados levantada nos anais (solicite acesso)
baseado em uma pesquisa de caráter documental e bibliográfico, levantei os cem artigos disponíveis entre as edições de 2014 e 2021 do evento (2022 ainda não foi publicado). a ideia foi responder as perguntas acima. a pesquisa se justifica por ser um evento acadêmico, dentro de um reconhecido evento profissional, altamente segmentado, que em 2023 chegou a sua décima edição (portanto, consolidado no calendário). junto com minha orientadora devo amadurecer esses resultados e a ideia é que, somando as duas edições que faltam, possa gerar uma publicação em periódico.
dez achados na busca por uma agenda de pesquisa sobre a cobertura das plataformas nos anais do Seminário de Pesquisa em Jornalismo Investigativo da Abraji
uma breve e geral descrição dos anais: as pesquisas se concentram na produção de reportagens com investigações guiadas por dados, impulsionadas ou ancoradas pela Lei de Acesso à Informação – LAI e com grande interesse, consequentemente, no poder público e que reflete a prática através de análises (de conteúdo, principalmente, mas também documental) e de casos.
há uma forte associação entre jornalismo investigativo e de dados, principalmente os públicos. de cara, isso parece desafiar a pesquisa da cobertura das plataformas: como buscar dados guardados por empresas privadas cuja especialidade são justamente os dados?
esse conjunto de pesquisa se preocupa com a plataformização? não. o único fenômeno desse universo que se tem interesse é o da desinformação/fact-checking, um problema claro das mídias sociais. nos artigos do seminário, as plataformas aparecem muito mais associadas às ferramentas usadas pelos jornalistas para apuração (e até mesmo pelos próprios pesquisadores), como espaço de circulação, de colaboração e de discussões sobre os trabalhos jornalísticos e, em menor proporção, como “espaço” da esfera pública para ser coberto.
inspirada na separação amplamente documentada nos anais da Abraji entre o jornalismo investigativo e o jornalismo sobre investigação, penso que é importante uma distinção entre as reportagens nas ou pelas mídias sociais das reportagens investigativas sobre as big techs. proponho: as primeiras têm as mídias sociais como praça pública, cobre discursos, ações e eventos que acontecem nas ou pelas redes, enquanto a segunda categoria parece ter como foco a implicação direta das plataformas e o escrutínio da governança algorítmica.
tarefa árdua encontrar um jornalista da nova geração ou estudante de jornalismo que não tenha, nos últimos anos, passado por um treinamento do Google News Initiative ou da Meta Journalism Project. as pesquisas do seminário têm forte preocupação com a formação de um melhor jornalismo investigativo. minha reflexão a partir disso: devemos considerar não apenas a necessidade clara de capacitação dos profissionais para essa cobertura altamente segmentada, mas também onde, quem e com quais discursos certas capacitações ocorrem.
a regulamentação do acesso à informação pública (LAI) estruturou a prática e alavancou o trabalho de jornalistas brasileiros com o tratamento de dados públicos. assim, vale colocar no radar como as políticas estatais, como a regulação das plataformas, podem afetar não somente o funcionamento, mas também a cobertura das plataformas digitais.
se as fontes se escondem, o jornalismo de dados mostra a verdade. é o que se infere do discurso sobre o jornalismo de dados nos anais. assim, a famosa “caixa-preta” das big techs desafiam essa prática do jornalismo e pode não apenas se limitar a base de dados e documentos vazados, mas podendo incorporar patentes, linhas de códigos e até inteligência artificial generativas em suas apurações. além da checagem da autenticidade de documento, muitas discussões éticas e jurídicas têm potencial nessa seara.
tal como as pesquisas do seminário se preocupam como a atuação das profissionais mulheres na área, a cobertura das plataformas pode ampliar esse aspecto e incluir a investigação sobre vieses de aspectos raciais e de gênero em decisões algorítmicas, além de qualificar o modo como se pauta o fato das plataformas de mídia social estarem abrigando sexismo, racismo e xenofobia.
não se pode ignorar as condições de trabalho dos jornalistas, considerados também profissionais plataformizados e que lidam com a intensificação da virtualização do trabalho que também os empurram para maior dependência das plataformas quanto às ferramentas de trabalho e de compartilhamento de informações com as equipes.
está na hora de organizações (como a própria Abraji) criarem premiações e categorias que incentivem a cobertura das plataformas, bem como é preciso de uma discussão econômica profundada do que “se há dependência financeira, logo/por conta disso, há viés na cobertura”, especialmente na discussão sobre as plataformas.
cobertura de plataforma ou empresarial?
durante a discussão dos trabalhos, o professor Marcelo Träsel (UFRGS) me fez uma provocação que sei que preciso encarar: há muita diferença entre a cobertura das plataformas da cobertura empresarial que os veículos sempre fizeram? eu penso que sim, especialmente pelo impacto público das decisões das plataformas, da centralidade das suas atividades e principalmente sobre como cobrir a atividade dessas empresas, que parece estar bem longe daquela cobertura econômica ‘básica’ de ver balancetes. nesse sentido, quero reler os capítulos sobre cobertura de empresas do livro Anatomia da Reportagem de Frederico Vasconcelos (Publifolha).
em vídeo, ‘gaguejos’ ao responder o professor denunciam que tenho muito o que pensar sobre essas distinções 😅
eita news multimídia 😅
os bastidores
foi a primeira vez que as sessões do Seminário estiveram dentro da programação regular do evento o que é ótimo e permite maior integração entre academia e mercado. expectativa que essa integração seja maior nas próximas edições.
a Abraji cobriu todas as despesas de transporte, hospedagem e inscrição de um representante dos trabalhos aprovados no seminário. valeu, Abraji!
NO QUE ESTOU TRABALHANDO AGORA
👨🏽🏫 estarei no segundo dia do workshop Plataformização e o Jornalismo Digital Contemporâneo, que tem a professora Suzana Barbosa à frente. a atividade acontece de noite entre os dias 23 e 25 de agosto e é organizada pelo COM+ USP. vou falar sobre platform beat por lá. evento online e inscrições gratuitas. vumbora?
PRÓXIMA EDIÇÃO
📅 3/3 até o final de semana solto a última parte do que vi de interessante no congresso da Abraji e que não coube nessas duas primeiras edições;